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Lula Zen: “Eu precisava fazer pela ideia, pela coisa do protesto”, conta seu criador Emmanuel Cansanção

Lula Zen por Emmanuel e Identita - Identità

por  Cláudia Motta

Lula Zen surgiu quando ele (Lula) estava preso. Enquanto o mundo estava explodindo ele estava preso, mas tranquilo, sabia que ia sair. E quando ele saísse o mundo voltaria ao normal.” Ainda falta muito para o mundo voltar ao normal, mas Lula está livre. E o escultor Emmanuel Cansanção, um dos milhões de Lulas que permaneceram defendendo as ideias do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante seus 580 dias de prisão política, está realizando um sonho. Sua escultura Lula Zen faz parte agora do acervo da Identità e já está à venda no site. Uma obra autoral, cheia de significado e da história desse artista que traduz a realidade de tantos outros artistas desse imenso Brasil. 

Lula Zen nasceu em tempos difíceis para o pernambucano Emmanuel e para tantos brasileiros. O Brasil padecia diante de um segundo golpe em dois anos. Em agosto de 2016 o injusto impeachment da presidenta Dilma Rousseff. E em abril de 2018, a absurda prisão política de Lula. “Morei seis meses na quitinete com Lula pagando minhas contas. O presidente”, brinca Emmanuel. “Ele preso e eu vendendo Lula basicamente. Só fazia Lula.”

Usando a #LulaLivre, Emmanuel postava fotos das suas peças nas redes sociais e vendia tudo. “Ele tava preso, eu livre, mas preso na quitinete trabalhando pra caramba, fazendo três, quatro Lulas por dia. Eu precisava fazer: pela ideia, pela coisa do protesto”, conta, com a voz embargada. “Tá errado, Lula tem de estar solto.”

E vendia “pra caramba”, lembra o artista de 45 anos de idade, 25 deles vividos na arte da escultura. “Era muito Lula. Assim eu pagava meu aluguel, comprei minha geladeira, meu fogão, fazia meu churrasquinho feito ele fala. Esse cara é demais. Lula foi a peça que mais vendi e vendo até hoje, junto com (Ariano) Suassuna e Chico Science”, respectivamente o escritor e o compositor, dois grandes artistas do Nordeste brasileiro. (leia mais, abaixo sobre a história de Emmanuel Cansanção)  

A parceria com a Identità

Aos 45 anos de idade e 25 anos como escultor, Emmanuel fala sobre a emoção de trabalhar com a Id. “Quando eu conheci Renata Moreira foi logo depois dessa coisa do Lula Livre. Eu tava com muito trampo. Chegamos a ter um ateliê com vários garotos de comunidade trabalhando com a gente, ensinando a todo mundo. E já estava com a ideia de fazer o busto de Lula para a campanha. Aí, por coincidência, papai do céu maravilhoso fez o link entre mim e Renata”, lembra o escultor. “Estávamos com a mesma ideia, mas naquele momento eu não podia fazer. Assim que tive tempo, falei: vou fazer o Lula. Tanto eu como minha companheira, a gente sentia necessidade de fazer esse trampo. E  a id queria comprar meu trabalho, a minha peça, o trabalho do artista Cansanção. Isso é o mais valioso pra mim.”

Para o artista, não se trata de vender um boneco, mas para quem está vendendo. Foi assim durante toda sua trajetória. 

Lula Zen “dar certo” para Emmanuel e para a Identità é muito importante. E vai além, na mesma lógica que motivou os criadores da Id. “Quero que continue e renda mais frutos, pra mim e para outros artistas. Quero fazer projetos de cultura com eles da id para ensinar jovens carentes, idosos, a galera que está na rua, mães, desempregados, pra galera que saiu do presídio, que tá sem opção, não sabe o que fazer. É um caminho para ganhar dinheiro, ter uma formação, ser profissional. Quero fazer isso, tocar essa galera, encontrar o artista neles. Lula Zen é um pontapé inicial do que a gente pode fazer.” 

Lula presidente

Emmanuel lembra que quando Lula Zen foi feito a ideia da mensagem era essa: “estou preso mas estou zen, estou meditando, me cuidando, lendo, então façam o mesmo”, diz, assumindo a voz do inspirador de sua obra. “Porque vou sair dessa prisão e quando sair dessa injustiça a gente vai estar de volta todo mundo junto. Tomando cerveja, fazendo churrasco, financiando carro, indo pra universidade, viajando pro exterior, andando de avião, indo pra shopping center, abrindo comércio, trabalhando, saúde. Continuando nossos projetos, nada de guerra, de arma. Direitos iguais: o preto, o pobre, o gay, a mulher, a mãe, o pai, as crianças, o artista, o trabalhador.”

E comemora. “Estou muito feliz e ansioso! Quero que isso chegue e vire presentes de gente que se ama. Que virem fotos de perfil. É isso que quero. Tá bonito ele!”

A relação com Lula é de um carinho paternal. “É o papai Lula mesmo, o pai do povo. O cara! Meu primeiro voto foi nele quando foi presidente. Lembro muito bem que a gente vinha de uma crise. Tinha crise do leite, do frango, da carne, filas para pegar tíquetes e conseguir comida. Eu e um primo que éramos mais ligados, ficávamos ouvindo meu pai, os amigos falando: o cara é Lula, o partido dos trabalhadores. Olha a força desse nome”, diz. “Eu via um pernambucano ali, tava vendo meu pai, tem até uma semelhança. Lula é o cara do povo. Não é o dos marajás, dos banqueiros, do capitalismo, dessa coisa.”

E lembra do tempo em que Lula era presidente. “Na cultura foi o tempo que mais se viu eventos nas cidades. Shows, exposições, museus. Olha quem era ministro de Cultura: Gilberto Gil! Olinda com a prefeita Luciana Santos. Recife com o prefeito João Paulo. Era demais!”

Emmanuel diz que gosta mesmo é do PT. “É uma sigla mais verdadeira. É uma simbologia muito forte, é o partido dos trabalhadores, o povo. Lula representa isso: os negros, os padres, a classe LGBT, o favelado, o trabalhador, o comerciante, Lula representa os empresários. Lula representa o Brasil inteiro.”

E conta ter pelo ex-presidente uma admiração muito grande, assim como tem por Pepe Mujica (ex-presidente do Uruguai), por Nelson Mandela (ex-presidente da África do Sul). “Sou fãzão mesmo. Faço minhas peças com amor, de coração. Faço sabendo que estou do lado certo. Estou nessa e quero Lula presidente. E se tudo correr bem, será no primeiro turno. Um pernambucano desses, vira presidente do Brasil, cidadão do mundo, respeitado no mundo inteiro. Hoje o Brasil é chacota. O presidente do Brasil é Lula, Bolsonaro é uma chacota. Todo mundo sabe que a liderança no Brasil é Lula. Boa parte do país e do mundo está esperando que Lula volte e eu também.”

Identidade e resistência

Sobre as peças que chegarão à casa de quem comprar um Lula Zen, o artista destaca ser um trabalho de resistência muito grande. “E feito com amor. Isso aqui é coração, tem minha mão fazendo. Você está vendo minha energia ali, minha força, minha identidade naquilo ali. Do jeito que é”, afirma. “Ainda não somos bem acabados, somos um povo mal acabado, e continua sendo. Meu trabalho continua sendo assim. E vai para onde tiver de ir, assim, como eu sou e como é o povo brasileiro. Ainda não estamos bem acabados. Somos lindos de essência, mas mal acabados. Fortes, ricos de matéria prima, riqueza espiritual, artística, mas ainda desconstruídos. Meu trabalho é assim: bonito, bem feito, com essência, com amor, com identidade. E quando você olhar vai ver meu dedo lá, minha ferramenta que passou ali, e que deixou de passar”, avisa.

“Trabalho com barro, com tempo. Com os quatro elementos: terra, ar, fogo, a água. Se chove é ruim para trabalhar. Se esquenta demais também tá ruim. É tudo uma alquimia muito grande.” 

“Que esse Lula Zen vá para as pessoas e seja um símbolo de resistência, de paz”, diz o artista

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